domingo, 30 de novembro de 2008

DIARIO (3) - NOVEMBRO DE 2008

Quinta do Anjo, 1 de Novembro de 2008

Dia de homenagem aos familiares e amigos já falecidos. Dia em que vamos aos cemitérios levar um ramo de flores e recolhermo-nos, respeitosamente, perante a memória daqueles que deixaram de acompanhar a vida.
De forma inconsciente, matamos as flores para as dar aos mortos, não pensando que aquela homenagem é apenas ao vazio, que aquela pessoa já está à distância de um mundo e que quando ela partiu, a morte entrou clandestinamente no nosso corpo e aguarda, apenas, a sua vez para nos juntar de novo na eternidade.
Nunca conseguimos vencer a morte, no entanto, vamos-lhe dando sucessivas negas, só assim temos a ilusão de a vencer.


Quinta do Anjo, 2 de Novembro de 2008

Passo os dias sem fazer nada, inércia por obrigação, sempre à espera de uma chamada, de uma mensagem, ou de alguém que me faça descansar do cansaço de nada fazer.

Quinta do Anjo, 3 de Novembro de 2008

Ando numa fase da minha vida em que não consigo ouvir políticos ou falar de política!
Não se consegue descortinar nada de positivo, apenas maledicência, uns dizem que os outros fizeram mal no passado, outros que estão a fazer mal no presente, não oiço ninguém falar do que é necessário fazer no futuro para melhorar as nossas vidas.
Estes homens a quem, através do voto, entregamos os nossos destinos, o bem-estar da comunidade, falam muito em nome do povo, mas apenas se preocupam em defender interesses dúbios, pedir sempre mais sacrifícios a uma geração cansada de tudo dar e pouco receber, quando para eles o fausto é evidente: bons carros, banquetes ditos oficiais, passeios por todo o mundo, aposentação ao fim de escassos anos de funções, reformas chorudas, enfim o pior dos exemplos para quem pretende mobilização e compreensão para vencer a crise, em que permanente vamos estando mergulhados e da qual não conseguimos sair.
Um dia destes, aconteceu-me uma situação que revela toda a mentalidade mesquinha destes senhores que nos governam: um qualquer senhor ministro no seu carro oficial, deve ter-se levantado tarde, acompanhado de um cortejo de batedores da polícia a tocar sirenes e a abrir caminho por entre o trânsito congestionado das ruas da nossa capital, obrigando todos os outros carros a encostar e a deixarem aberto um corredor para S. Exa. passar! Claro, estes automobilistas não são gente, são apenas os bobos da corte dos donos deste pobre Portugal. Em alguns países, especialmente os nórdicos, os ministros andam de transportes públicos, ou de bicicleta.
O poder é autocrático, não respeita e não ouve, ou ouve apenas a própria voz.

Quinta do Anjo, 4 de Novembro de 2008

Dia de eleições nos Estados Unidos da América. Uma janela de esperança para o mundo, caso venha a ganhar Barack Obama.
Andamos todos saturados de políticos como Bush, Barroso, Putin, Hu Jintao e outros, homens que governam ou tem influência, no mundo de todos nós.
Até posso estar enganado e Obama acabar por ser igual, ou pior, do que o seu antecessor no cargo, o que no caso será extremamente difícil, no entanto, é uma situação nova, as ideias que exibe, as origens, a juventude, penso que será possível erradicar o aspecto bélico que tem sido apanágio da política dos EUA nos últimos tempos e direccionar esses gigantescos orçamentos de morte, em favor de novas políticas na assistência aos mais desfavorecidos e às diversas misérias que, infelizmente, grassam na terra, assim como uma nova política nos aspectos ambientais, uma das áreas mais importantes para as gerações futuras.
Não podemos viver sem esperança, mesmo que seja a esperança de poder sonhar.

Quinta do Anjo, 5 de Novembro de 2008

‘Yes, we can’! Ganhou Obama nos EUA!
Como uma andorinha não faz a Primavera, também não será apenas um homem a mudar o mundo, mas este slogan de convicção, faz-me acreditar que em conjunto podemos criar condições para modificar esta triste realidade em que nos vamos arrastando.
Não acredito em seres providenciais, messias, iluminados, ou outros, mas acredito em bandeiras mobilizadoras das inteligências, que permitam, no presente, descobrir novos rumos para um futuro que todos queremos melhor.
Uma pessoa só, em ambiente fechado, chega para desafiar o mundo e ter sempre razão, mas muitas pessoas juntas, em espaço aberto, constroem um mundo novo, com muita mais razão.


Quinta do Anjo, 6 de Novembro de 2008

Foi hoje publicada, no Jornal de Arganil, uma prosa que fiz de homenagem ao meu pai, falecido, faz agora 12 anos, no dia 11 de Novembro.
É um registo que faço com muita emoção, com muita saudade, cada dia sinto mais a ausência do meu velho.
Sempre que regresso à minha aldeia, Travessas, pareço ver o vulto familiar do homem que era o símbolo da terra. Todos o conheciam por ‘Acácio das Travessas’ e com que orgulho ele transportava esse nome!
O meu pai faleceu no dia de S. Martinho, normalmente um dia de clima diferente – Verão de S. Martinho -, todavia, no dia da sua partida, Deus com remorso de o ter mandado regressar prematuramente, mandou este Santo dar-nos um dia de Inverno, um dia de chuva e frio, tempo este que nos molhou os olhos e gelou a alma no momento da despedida.

Quinta do Anjo, 7 de Novembro de 2008

Há momentos na vida em que nos alimentamos de paixão, noutros alimentamo-nos de comida.

Quinta do Anjo, 8 de Novembro de 2008

Aceito perfeitamente que discordem das minhas ideias e das minhas opiniões, que o afirmem abertamente, frontalmente e sem rodeios, mesmo que sejam agressivos e mesmo violentos nas suas críticas, a liberdade de podermos dizer aquilo que pensamos e em que acreditamos, é um direito que assiste a todos. Já não aceito a mesquinhez, o dizer mal por dizer, o falar nas nossas costas, o desvirtuar do que falamos ou escrevemos, a difamação, a cobardia da inveja…
No confronto de ideias, sempre aprendo algo na diversidade de opiniões, nas calúnias, fico transtornado, incapaz de reagir, sinto-me totalmente perdido!
É verdade, muitas vezes revelo a alma a pessoas indignas da revelação.

Quinta do Anjo, 9 de Novembro de 2008

Tive há pouco de parar o carro e aguardar, pacientemente, que um rebanho de ovelhas, enquadrado por um pastor e dois cães atravessasse a estrada em que seguia.
Esta imagem fez-me lembrar as várias manifestações de pessoas em protesto, tal como ainda ontem, em Lisboa, a manifestação dos Professores.
Independentemente das razões que assistem às pessoas, para virem para as ruas reclamar direitos que julgam justos, é sempre com um misto de desencanto e tristeza que verifico seres humanos agirem exactamente igual à dos animais irracionais.
Aqui, na aldeia, um pastor e dois cães enquadram um rebanho de ovelhas e carneiros, a caminho do pasto ou do curral; ali, na cidade, meia dúzia de indivíduos enquadram uma massa humana, dizem-lhe os passos que devem dar, as palavras de ordem que devem dizer, os cartazes que devem transportar, e muitas vezes o ódio e as ofensas que devem manifestar.
Não sou contra as diversas formas de protesto, incluindo as manifestações, desde que em ambiente ordeiro e solidário, sou contra este estilo de protesto, de uma classe que vai formar os homens do amanhã e que utiliza expressões como governo de ‘bandidos’ e ‘corja de patifes’, que apresenta indivíduos engaiolados, desenhos de gosto muito duvidoso e outros mimos.
Não sei onde existe maior ‘carneirada’: se na manifestação da natureza, sempre assim desde a ancestralidade; se o seguidismo do actual, em que as pessoas não conseguem vingar as suas ideias através da inteligência e do diálogo.
Nos rebanhos de ovelhas o único perigo é aparecer um lobo disfarçado de cordeiro, nas manifestações de massas há sempre lobos disfarçados, que entram na mente das pessoas, lhe castram o espírito, os tornam dóceis presas e facilitam o aparecimento de novos messias, não divinos.

Quinta do Anjo, 10 de Novembro de 2008

Penso que vou ter dificuldade em aceitar a velhice, a decadência física da vida… É como se tentasse parar a marrada dum toiro bravo, com uma pena.

Quinta do Anjo, 11 de Novembro de 2008

Dia de São Martinho, dia das castanhas, do vinho e da água-pé!
Na minha terra, Travessas, em tempos idos comemorava-se condignamente este dia, juntando-se o povo, normalmente no largo do Cabeço, para o tradicional magusto e a prova do vinho novo, em que todos confraternizavam em franca harmonia, se brincava, contava anedotas e, de forma fraterna, todos bebiam pela mesma garrafa ou garrafão.
No actual, a voragem da vida, e a maldade dos homens, apagou as fogueiras e, hoje, apenas restam as cinzas do passado.


Quinta do Anjo, 12 de Novembro de 2008

A minha resposta a uma amiga, que ficou um pouco zangada quando lhe chamei a atenção para a necessidade de fazer ginástica, devido a alguns centímetros (‘pneus’) a mais na cintura: -- sabes, o desnível entre os montes e o vale nunca pode ser outro monte!

Quinta do Anjo, 13 de Novembro de 2008

Estou a olhar a Lua, em fase de Lua - Cheia.
É linda, a Lua, em noite límpida, em noite de estrelas!
Falamos muito do Sol, a luz do dia, o que representa para a vida, o seu calor, a poesia do amanhecer, do entardecer…
Esquecemos um pouco a Lua, a luz da noite, a igual influência em muitos aspectos da existência, como no aspecto físico, marés, colheitas, etc., o romantismo dum luar de Agosto…
Lua é vida!
Lua é paixão!
Lua é amor!
…É vida, sempre em crescendo até ao quarto minguante;
…é paixão, paixão nova, paixão crescente, paixão cheia, paixão minguante;
…é amor, os beijos apaixonados à luz do luar, o reflexo do brilho na imensidão do olhar da pessoa amada e aquela figura que vislumbramos na claridade da superfície lunar, é a imagem do nosso amor, fazendo-nos companhia, nas noites em que não podemos estar a seu lado…
Lua é o encanto da noite, a caminho do sol nascente.

Quinta do Anjo, 14 de Novembro de 2008

Passamos a existência no apeadeiro da vida esperando a chegada da felicidade, mas este comboio nunca pára nos apeadeiros.

Quinta do Anjo, 15 de Novembro de 2008

Somos um País eternamente adiado!
Protestos, greves, manifestações, é o quotidiano de Portugal, cada vez mais pequeno, cada vez mais pobre…
Em vez do diálogo, a mudez; em vez de construir, destruir; em vez de ideias, o confronto; em vez de paz, guerra; em vez de flores, pedras…
Talvez espelho dos maus governos que temos tido e das más políticas que emanam dessa situação, é ver os Portugueses cada vez mais natureza primitiva: rebanho de carneiros, pássaros cantantes e lobos uivantes, é o nosso regresso às origens, imitando, de forma agressiva a pureza da vida.
Não procuramos ideias novas, apenas ajustes de contas do passado.

Quinta do Anjo, 16 de Novembro de 2008

Em tempos passados, na longa noite da nossa escuridão, o povo vivia, essencialmente, na sonolência que lhe dava o regime, do ópio dos 3-FFF´s: Fátima, Fado e Futebol.
Mais tarde e com o advento da democracia, a situação pouco se alterou, apenas se mudou o ‘F de fado’, para o ‘P de politica’, ficando assim agora a sigla: FFP, Fátima, Futebol e Política.
Outrora, Fátima era 13 de Maio e 13 de Outubro, agora é dia 13 de todos os meses; futebol era aos domingos (nacional) e às quartas (internacional), agora é às sextas, sábados, domingos e segundas (nacional) e terças, quartas e quintas (internacional); o fado era nas casas próprias, normalmente à noite, agora a política é a todas as horas, em casa, no café, no rádio e nas televisões.
Mudam-se os tempos, a droga é a mesma, só que o povo precisa de mais quantidade para conseguir levitar.

Quinta do Anjo, 17 de Novembro de 2008

Oiço falar as pessoas, muitas delas com esperança e cheias de boas intenções.
O problema é que semeiam essas boas intenções na areia da praia, regadas com água do mar!

Lisboa, 18 de Novembro de 2008

Sempre que, por qualquer motivo, tenho de ir a Lisboa sinto-me nervoso e angustiado.
Não sei verdadeiramente a razão deste estado de alma, até porque trabalhei na capital durante quatro décadas e conheço quase de olhos fechados todos os locais, dos mais deprimentes aos mais belos e típicos.
Lisboa está uma cidade decadente, triste, edifícios velhos, alguns entaipados, a precisar de urgentes obras, só residem aqui pessoas envelhecidas e sombrias e as outras pessoas que aqui trabalham, circulam no quotidiano da correria, do stress, das filas de automóveis, de apitos e impropérios…
O centro da cidade – a Baixa -, é um retiro de vendedores tipo ‘time-sharing’, é pedintes, é empregados de restaurante a vender almoços ‘a la carte’ em plena rua, é uma miscelânea de apátridas, ou abandonados, de raças, religiões e credos, é droga em pleno dia, é lixo a cada passo…
Há uma coisa que me continua a fascinar nesta cidade: a zona ribeirinha, o rio Tejo, o seu desaguar de esperança, o contraste com o nosso desespero, que nunca desagua.
Em tudo o resto, Lisboa, é noite em pleno dia!

Quinta do Anjo, 19 de Novembro de 2008

A natureza e o futuro são a esperança da vida: a natureza rejuvenesce todos os dias, é a eternidade; o futuro é a renovação do presente, é a confiança.
Não saber olhar a natureza e não ter esperança no futuro, é não saber onde termina a sombra e começa a luz, é andar sempre no presente a olhar o passado, é ser velho em qualquer idade…
No destino da humanidade há sempre um amanhã de esperança, e também a natureza, na sua pureza, recusa dar-nos símbolos de fatal inquietude, dificilmente encontramos flores pretas.

Quinta do Anjo, 20 de Novembro de 2008

Ao desfolhar hoje uma margarida/malmequer, saiu-me a pétala ‘bem-me-quer, muito’.
Na rotina do quotidiano, um momento de enlevo, um momento de paixão…
Nem todos os dias me saem ‘mal-me-queres’ no desfolhar da vida!

Quinta do Anjo, 21 de Novembro de 2008

Há um ditado, ou uma máxima, que diz: a realização plena do homem é plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro.
Se isto correspondesse a alguma realidade, eu seria um homem realizado!
Durante toda a minha vida, plantei muitas árvores, já tive dois filhos e se não escrevi um livro, escrevi muita prosa, a qual compilada, daria muitos livros.
É óbvio que isto é ditado e não aceito, de forma alguma, máximas que querem que acredite.
Nunca me hei-de considerar um ser realizado, até à hora da partida vou ser sempre um ser inquieto!
Como posso sentir-me realizado se faço parte dum mundo, em que há guerras, com milhões de inocentes mortos, em que parte da humanidade passa fome, em que pessoas vivem debaixo de pontes e em barracas, em que crianças andam nuas por não terem roupa, em que se destrói a natureza, por maldade ou com a fobia do lucro, em que armas letais ameaçam a extinção da espécie humana…
Alguém pode viver de consciência tranquila, com todo este estado de coisas e dizer-se pessoa realizada? Só seres anormais, ignorantes, estupidificados, nababos e outras escórias humanas, podem aceitar o ignóbil sem um assomo de revolta, de desassossego…
Não, nesta vida, nunca serei um homem realizado, sou mais um ser angustiado.

Quinta do Anjo, 22 de Novembro de 2008

O mundo hoje é das mulheres!
Esta frase define uma realidade, a ascensão das mulheres em todas as áreas da vida: a coragem e firmeza no aspecto familiar, a competência no trabalho, a dedicação e aplicação nos estudos, a autoridade e personalidade na direcção de equipas e empresas, a inteligência, a perspicácia e a perseverança, enfim, atributos a que actualmente fazemos justiça e que, outrora - e infelizmente ainda hoje em alguns pontos do Globo -, se desprezava, no sentimento machista do homem inteligente e dominador.
Também é verdade que ainda agora, muitas mulheres usam o corpo como objecto sexual, não só na prostituição, mas igualmente na publicidade e demonstração de produtos e outras cativam os homens como Eva seduziu Adão no Jardim de Éden.
A mulher é beleza, é paixão, é a obsessão dos homens, a obra-prima de Deus…
Quando era jovem dizia que as mulheres só me venciam, despindo-se…Hoje basta um olhar e fico logo vencido!

Quinta do Anjo, 23 de Novembro de 2008

Como pode, na nossa mente, um dia de Sol, linearmente igual, ser de manhã radiosa luz e de tarde angustiantes brumas.
Na verdade, o mais significativo do nosso espírito não vem à luz do dia.

Quinta do Anjo, 24 de Novembro de 2008

Há tempos, na Urbanização onde trabalho, uma árvore secou e um colega meu plantou uma nova nesse local.
A árvore depressa cresceu e alguns ramos mais frondosos estavam a dificultar a passagem das pessoas pelo passeio. Passados alguns dias passou por ali um indivíduo que, sem mais delongas, com uma moto - serra, decapitou literalmente a planta e todos os seus ramos, o que lhe ocasionou a morte.
Como é possível uma pessoa ter instintos tão selváticos, o lógico seria cortar os ramos que estorvavam e deixar a árvore e a natureza cumprirem o seu destino.
Na iniquidade e maldade do homem encontramos as razões para a inconstância dos elementos da natureza e o abastardar do mundo.

Quinta do Anjo, 25 de Novembro de 2008

Dia da comemoração de mais um golpe ou contra – golpe da nossa revolução de Abril, mais concretamente a fase final do PREC (processo revolucionário em curso).
Esta acção marcou o fim da instabilidade que se vivia em Portugal, uma fase em que se cometeram muitos erros, mas a verdade é que sem a experiência dos erros não há verdadeiras certezas, foi também o regresso dos militares aos quartéis - nunca gostei de militares na rua -, e foi, verdadeiramente, o dealbar da democracia, não tutelada, no País.
Podemos não estar, hoje, como gostaríamos, no entanto, só de má fé se pode dizer que não houve uma melhoria enorme, em todos os aspectos, na condição de vida dos Portugueses.
Esta data pode ter muitas leituras, mas como nunca gostei de ditaduras, sejam elas de direita ou de esquerda, penso que foi um dia importante para a liberdade em Portugal.

Quinta do Anjo, 26 de Novembro de 2008

Estou a ver televisão e uma figura política que está a falar faz-me lembrar o passado no presente, sem qualquer esperança no futuro.

Jardia/Pinhal Novo, 27 de Novembro de 2008

Fui jantar a um restaurante que tem um espaço típico, ou seja uma antiga adega restaurada, em que ainda podemos ver os antigos utensílios necessários a uma adega tradicional dos velhos tempos. É um local agradável e romântico, a que não podia faltar a tradicional lareira para dar ainda mais calor a um ambiente já por si poético.
Por vezes é necessário avivar as chamas do amor, para evitar que a lareira desvaneça ou mesmo se venha a apagar.

Quinta do Anjo, 28 de Novembro de 2008

Às sextas-feiras, é um dos dias que tenho marcado para falar com a minha mãe, utente do Lar da Misericórdia de Arganil.
É um dia de natural alegria, ter oportunidade de ouvir a voz de alguém que me é querido, mas é, também, um dia de ansiedade no saber do seu estado de saúde, do seu estado emocional, como decorreu a semana…
Outrora, com famílias mais numerosas e a viverem quase em comunhão de bens e afectos, não havia necessidade destes afastamentos; hoje, com a modificação dos hábitos de vida, com a dispersão da família, com a obrigação do trabalho fora de portas, é um lugar-comum os mais velhos passarem o final das suas existências nestes ambientes fechados, situação muitas vezes incompreendida e não bem aceite, por quem sempre viveu em contacto com a natureza ou em ambientes mais arejados.
Ninguém gosta de andar empurrado e ver pelos olhos dos outros.

Quinta do Anjo, 29 de Novembro de 2008

Vejo o Outono em toda a sua amplitude: árvores despidas, folhas secas a voar em todas as direcções, céu cinzento, vento fugidio, chuva fria, por vezes granizo, decadência…
A natureza não foi pródiga na inspiração do Outono!
É a estação do ano que me inspira mais melancolia! Não é fácil aceitar a mudança dos radiosos dias de Verão para este decrépito Outono, assim como é nostálgica a passagem da exuberância, para o declínio da vida.
Como são semelhantes as estações do ano e as estações da vida! Em ambas, é como uma corrida de estafetas, sempre a passar o testemunho, só que enquanto as estações do ano, em ciclos iguais, recebem e passam o testemunho, as estações da vida nunca repetem a passagem do testemunho.

Quinta do Anjo, 30 de Novembro de 2008

Tubo bem?
É uma frase banal, que dizemos todos os dias, um lugar-comum, uma frase hipócrita.
Como é possível estar tudo bem na vida de qualquer pessoa!
Ainda há momentos estava a fazer esta mesma pergunta a uma pessoa amiga, quando me recordei que o marido tinha falecido há pouco mais de um mês.
Construímos na vida uma muralha de trivialidades, que não ultrapassamos e não queremos que os outros atravessem, procuramos o frívolo e o acessório das coisas, nunca o essencial.
Também, é verdade, que quando tentamos sair das frases feitas e queremos ser originais, ninguém nos compreende!

Quinta do Anjo, Novembro de 2008

Carlos Manuel F.Gonçalves

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