terça-feira, 15 de julho de 2008

TRAVESSAS (12) - Tia Eugénia

TRAVESSAS / TIA EUGENIA – HOMENAGEM E SAUDADE



Nasceu, em Celavisa, em 1910, ano da implantação da República em Portugal, mas depois do casamento viveu toda a sua vida em Travessas.
Seu nome: EUGENIA DIAS GONÇALVES.

Amou esta aldeia, porque amava a terra! Para ela o campo era a vida, era daí que vinha o sustento da família, era preciso cuidar bem dela, acarinhá-la, dar-lhe de comer e beber, porque sabia que ela lhe iria retribuir na colheita dos seus bens.

Era a primeira pessoa a levantar-se em Travessas! Quando os primeiros alvores do dia surgiam no horizonte era vê-la apressada, nos caminhos da serra, a colher mato ou lenha, era o inicio duma labuta diária que se prolongava, invariavelmente, até ao crepúsculo do anoitecer.

Era uma mulher de luta, uma mulher firme e determinada, para quem as dificuldades eram desafios, numa época em que as privações e o sofrimento eram o pão duro de todos os dias.

Recordo a firmeza de carácter, a simplicidade aliada a uma forte personalidade, uma maneira de ser frontal e honesta, a ausência da procura de ‘mexericos’ e conflitos…
Recordo os serões passados em alegres cavaqueiras, na descasca do milho ou dos feijões, em que ela, muitas vezes, se alheava da conversa e dormitava no intervalo entre duas espigas. Sinto saudade das festas e romarias em que a via exibir, com ar afidalgado, as suas melhores vestes, numa vaidade de província, que contrastava no trajar do vestido de chita e da capucha no frio Inverno.

Aprendi a admirar esta MULHER ainda menino e pela vida fora sempre a considerei um exemplo de carácter e dignidade, apanágio de coração bom em terra agreste.

Lutou e sofreu muito, mas sempre venceu! As privações foram muitas, acredito que, sem o manifestar, também teve os seus momentos de desânimo, mas tudo foi ultrapassando com a firmeza que sempre a caracterizou. Sofreu a partida dum filho no apogeu da vida, viu o marido, prematuramente, com alto grau de incapacidade física, venceu uma grave doença na década de oitenta, na adversidade encontrava forças para resistir. Tudo venceu, menos o fim, mas aí, eu penso, foi o cansaço da dura jornada e não a derrota dos vencidos.

Quando no dia de S. João, assisti à sua despedida deste mundo, na vila que a viu nascer, não pude deixar de cismar na singularidade da vida: a terra que ela tanto amou, estava agora a retribuir abraçando-a num ultimo adeus.

Até breve minha tia! A saudade, o amor e a minha homenagem a uma grande MULHER.

Quinta do Anjo/Palmela, 27 de Junho de 2008

Carlos Manuel F. Gonçalves
mail: carlos.mgoncalves49@gmail.com
blog: http://www.travessas.blogspot.com
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(Jornal de Arganil nº. 4154 de 17 de Julho de 2008)

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