sexta-feira, 23 de abril de 2010

25 DE ABRIL [liberdade... sempre]!



Escrevi, o ano passado, uma trilogia relacionada com o 25 de Abril, considerando o dia 24, como o ontem, passado; o dia 25, como o hoje, presente; e o dia 26, como o amanhã, futuro. Numa actualidade, sempre presente, volto a publicar, hoje, este texto, sem quaisquer intuitos políticos, apenas a minha visão dos acontecimentos, que vivi na minha juventude:




24 DE ABRIL – ONTEM [PASSADO]

Analisando, em primeiro lugar, o 24 de Abril sob um prisma diferente, o das personalidades do Estado Novo, causa-me uma enorme perplexidade como as duas figuras principais deste regime – Oliveira Salazar e Marcelo Caetano -, que, nasceram, ou tiveram ligações profundas à minha região, à Beira Serra, mais propriamente, Salazar nasceu em Santa Comba Dão e Marcelo Caetano, apesar de ter nascido em Lisboa, os seus pais eram naturais desta região, o pai de Pessegueiro, Pampilhosa da Serra e a mãe de Colmeal, Góis, sim, como é possível, estes homens terem sido uns tiranos, ditadores, inimigos da liberdade…
Estou convicto que estes déspotas nunca subiram a uma serra destas aldeias, nunca pisaram o mato perfumado ou uma fraga destes montes, não admiraram o sublime voar da águia e o cantar da cotovia, não se sentiram extasiados no sentimento de paz e liberdade que se vive no encanto da natureza, não conviveram com o povo simples destas terras…
Só posso aceitar uma explicação para o desvirtuar das origens desta gente: eles nasceram, ou estiveram aqui, apenas de passagem, não criaram raízes na maravilha deste paraíso, neste hino à liberdade!

Hoje, dia 24, relembro o ontem, o passado, a escuridão, as trevas…
Recordo, a ditadura, com a consequente ausência de liberdade, a fome e a miséria… Lembro um povo amordaçado - um povo que sempre pugnou por ser livre, que andou pelos quatro cantos do mundo -, agora obrigado a exilar-se e a emigrar, muitas vezes a salto, para sobreviver, a fugir dos horrores da guerra, a viver censurado e mudo para escapar às torturas dos calabouços da Pide, das cadeias de Aljube, Peniche ou Caxias, ao campo de concentração do Tarrafal…
Privar uma pessoa da liberdade e mesmo matar, apenas por delitos de opinião ou de expressão, por ansiar e procurar melhores condições de vida, por recusar o ultrajante, é a mais ignóbil das tiranias, é o sentir que só, pela violência, os ditadores procuram forçar a unanimidade.
Vivi uma parte da minha vida, 25 anos, neste regime opressivo, numa inconsciência colectiva de que só despertei quando cheguei à cidade. A escola e, mais tarde, o serviço militar, abriram-me os olhos para a cruel realidade, até ai, na aldeia, o povo aceitava, sem um grito de revolta, as agruras da existência, nas orações o clero ensinava a dar graças a Deus, para merecer as penúrias da existência.
Este regime cruel tinha de ter o seu fim, o que, felizmente, aconteceu há já 35 anos, na data que amanhã se comemora, 25 de Abril. Para mim, amante das belezas da vida, da natureza e da liberdade, presto a minha homenagem aos homens e a um povo que lutou para merecer o direito de ser livre.
Apesar das vicissitudes da vida, valeu a pena nascer para viver o renascimento da liberdade em Portugal, para viver o 25 de Abril de 1974.




25 DE ABRIL – HOJE [PRESENTE]

Dia 25 de Abril, vivo o hoje, de há 35 anos, o durante e o presente, de uma data que foi de luz, que foi [é] de esperança…

- ‘Em cada esquina, um amigo’
- ‘Em cada rosto, igualdade’
- …

Não aceito viver sem democracia; não concebo que não tenhamos, todos, as mesmas oportunidades na vida; não suporto mordaças e perseguições por delitos de opinião; não admito prisões e campos de concentração para presos políticos; não compreendo a bestialidade em seres humanos; não tolero, independentemente da cor, regimes totalitários e ditadores; não aceito a existência sem liberdade…
São razões suficientes para gostar do 25 de Abril. Vivo sempre este dia com o coração alvoraçado e um frémito de emoção invade-me a alma.
Podia o após Abril de 1974 ter sido diferente? É evidente que sim! Cometeram-se demasiados erros, que esta geração e gerações futuras vão continuar a pagar, houve muitos atropelos à própria liberdade, de qualquer forma o balanço é positivo!
Muita coisa foi feita, o povo vive, inquestionavelmente, melhor, investiu-se nos acessos rodoviários, nos cuidados de saúde, na segurança social e na educação, hoje, deslocamo-nos mais facilmente, vivemos mais e melhor, temos melhores acessos ao conhecimento, sabemos mais…
Podia-se ter feito mais e melhor? Sem dúvida! No entanto, é com enorme satisfação que verifico, o facto dos meus filhos e dos meus netos não saberem o que é o fascismo, não conhecerem a ausência da liberdade e terem condições de vida inimagináveis na época em que me criei.
Por muito que custe aos saudosistas do passado e aos detractores do presente, é com orgulho que, hoje, passeio um cravo vermelho - mesmo murcho -, escrevo este texto e grito para mim próprio - na esperança de ser ouvido por todo o mundo -, um viva à liberdade!
- …
- ‘Terra da fraternidade’.




26 DE ABRIL – AMANHÃ [FUTURO]

Hoje, 26 de Abril, vivo o dia de amanhã, vivo o futuro…
Um futuro de esperança! Amanhã, vou estar perto do ocaso, os meus filhos, mais velhos e os meus netos, homens. A vida renova-se todos os dias, os jovens de hoje, mais ecológicos, vão agredir menos a natureza, vamos ter carros a hidrogénio e o homem vai chegar a Marte.
Costumo dizer que sou um homem de esperança, desesperançado; amanhã quero ter outro discurso, quero ser um homem desesperançado, com esperança!
As gerações futuras dão-me exactamente essa confiança! Quando vejo a inocência das crianças, a pureza dos meus netos, vejo o embrião duma futura sociedade de mais justiça, igualdade e fraternidade…
É óbvio, vai continuar a haver desigualdades, gente com fome e guerras na terra, não vamos conseguir erradicar essa praga de um momento para o outro, mas estou convicto de que uma nova geração de homens está a nascer, o mundo está a mudar, o fanatismo vai ser erradicado, temos de ser nós, adultos, a transmitir aos nossos descendentes o sonho de vida que sempre acalentámos e que, por inércia, egoísmo, maldade e louca ambição, não soubemos alcançar.
Sim! Pelos meus netos, pelas crianças de todo o mundo, pela vida, tenho esperança no amanhã, tenho esperança no futuro!


Carlos Manuel Fernandes Gonçalves

Quinta do Anjo, 23 de Abril de 2010


(Como salientei, não gosto de publicar textos opinativos sobre política, religião ou futebol, são temas fracturantes que evito discutir, especialmente com amigos, no entanto tenho a minha opinião, tenho valores que defendo, aceitando, na diversidade, de democrata, todas as opiniões contrárias. Nesta ideia, não tenho qualquer pejo em afirmar que: na politica sou anarca convicto, de esquerda por parte do meu pai; na religião sou ateu, agnóstico, católico por parte da minha mãe; no futebol sou do slb por mim e por parte dos outros 5.999.999 simpatizantes).

sábado, 10 de abril de 2010

ADEUS [... ilusão]



ADEUS [… ilusão]!


Tudo em mim é bruto, selvagem,
Semente da serra, vento, paisagem,
Origem da terra onde nasci.
Sonhei na minha serra o teu ser,
Pintei no teu corpo o meu viver,
Desvario, em louca ilusão por ti.

(Tudo na vida tem tempo e modo.
No tempo sonhei o modo da vida,
No modo perdi o tempo de amar.)


Na amargura de um desgosto,
Sinto beijos de chuva no rosto,
No orvalho das saudades de ti.
Bruma a serra este cacimbo,
No náufrago rumo de um nimbo,
Mar de lágrimas, onde te perdi.

(O adeus que eu sabia te iria escrever
)


Carlos Manuel Fernandes Gonçalves

Travessas, 10 de Abril de 2010